Mical pode chamar de "Davi", "amor", "guerreiro", ou o nome que quiser. Desde que seja prenunciado pela palavra "meu"
Quem já amou, um pouquinho que tenha sido, sabe que esquecer é difícil demais. Ninguém que tenha visto seus olhos brilharem no olhar alheio é capaz. Mais fácil seria morrer do que tirar a mulher amada da mente. Por isso Davi está de volta.
Na última vez em que o jovem plebeu esteve na casa real, ouviu notícias que teriam desesperado qualquer um, mas não um guerreiro.
“O rei não deseja dote algum, mas cem prepúcios de filisteus, para tomar vingança dos inimigos do rei”, disseram-lhe os servos de Saul.
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Sabendo que os filisteus, desde sempre, formam um povo bruto, o homem são deve temer entrar em suas terras e ameaçá-los, da maneira que for. Mas Davi não é um homem são, é um homem apaixonado.
Apaixonado pela mais doce mulher que seus instintos já perceberam. Quem já amou, ainda que só um pouco, sabe que os instintos são marcados a ferro em brasa quando se apaixona. Mais fácil seria decepar as próprias mãos do que esquecer o toque da pele; furar os ouvidos do que esquecer o canto da voz; arrancar o nariz do que esquecer o perfume; tirar os olhos fora do que esquecer a beleza. E, ainda assim, perdido no breu da ausência dos sentidos, seria possível sentir o gosto do amor.
Quando Saul enviou aquele recado a Davi, pobre de ouro, queria matá-lo. Não entendeu que o fogo ardente em sua alma o torna capaz de enfrentar o pior dos exércitos, mas não o permite golpear sua donzela com um “não”.
Quem já amou, ou mesmo quem apenas já ouviu falar do amor puro, bebido direto daquela fonte cristalina que só a alma alcança, sabe que qualquer menino vira homem perto de quem ama. Por isso Davi está de volta.
Apresenta ao rei não 100, mas 200 prepúcios filisteus. Surpreende um Saul cada vez mais invejoso, que agora deve cumprir sua palavra.
Ainda esta noite Davi desposará a princesa Mical. E já avisou o sol que dessa vez ele pode se atrasar.
(*) 1 Samuel 18:20-29
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